Nova legislação sobre registro da Ordem dos Músicos do Brasil

Imagina a cena: você está indo tocar com a sua banda em algum lugar. E então, um cara de sobre-tudo, esgueirando olhares sob as abas do seu chapéu, bota a mão sobre o seu peito antes que você entre no local em que iria tocar. O cara diz: “Eu sou um fiscal do Estado. Procuro por músicos que querem exercer a sua profissão sem ter o registro da Ordem dos Músicos do Brasil”. Você fica sem saber o que fazer: nunca tinha pensado que precisaria de um registro para tocar as suas canções aqui e acolá, e tentar viver disso. O cara lhe deixa ciente que você não pode ter esta profissão sem o registro – the music is over.

Felizmente, o cenário exagerado que construí no parágrafo anterior não é real. Você acharia bom que fosse exigido do músico que ele tenha um registro regimentado pelo Estado? Bem, acho que as opiniões confluem quase com unanimidade para a tese de que artistas se desenvolvem e vivem (quando vivem) da sua atividade artística e criativa independentemente de qualquer reconhecimento que seja autenticado, que provenha de uma autoridade dizendo: “esta pessoa pode exercer este ofício”.

Ontem, dia 1 de agosto, o Supremo Tribunal Federal (STF) teria decidido em unanimidade que músicos não precisam ter registro para exercer a sua profissão. Muitos argumentos bons têm sido apontados na discussão. Um deles, de parte de Ricardo Lewandowski, diz que exigir o registro do músico é análogo a exigir o registro de uma poeta, reconhecido pela “Ordem Nacional da Poesia”. Em suma: estamos falando de arte, e não de profissões que têm implicações desastrosas caso seja exercido por pessoas que não tem um registro, como pode acontecer no ramo da medicina, por exemplo.

Eu nunca ouvi falar de fiscais exigindo a carteirinha de músico, mas dizem as notícias que em muitos lugares no Brasil isto é feito. MAS, o esquema não é tão simples assim: a decisão judicial do Supremo foi para um caso particular, de um músico de Santa Catarina, que recorreu reclamando sobre a inviabilidade de ele viver da profissão de músico sem o registro. Ficou decidido, neste caso, que o músico estaria livre da exigência. O que está sendo sentenciado a nível federal é que diferentes ministros poderão ter a mesma decisão sobre pedidos deste gênero no tribunal. Em outras palavras: se o registro é cobrado de alguém que não o tem, e este alguém recorre no tribunal, esta pessoa será absolvida da exigência.

No mais fica tudo igual, mas não posso deixar de observar que isso NÃO FAZ SENTIDO. Existe o registro, e existe uma lei sobre ele. Esta lei não diz nem que ele é obrigatório simpliciter nem que ele é opcional simpliciter – a lei existe então só pra aumentar o fluxo do tribunal? Sim, por que a única coisa que esta lei vai fazer, é trazer um pouco de incomodação para o músico que recorre ao tribunal, e um pouco de perda de tempo para o ministro que vai dizer, de acordo com a “nova lei”, que está tudo bem, que o cara pode viver da música sem o registro. Ora! Nem seria necessário este trâmite todo!

Enfim, está aí o assunto para a reflexão.  =]